Quando vejo falar de pessoas que se identificam com os autores dos crimes que são vítimas, a princípio acho muito estranho, porque primeiramente sempre há chances de fugir ou chamar a atenção de alguém.
O que chama atenção é o fato de agüentar anos e até décadas em silêncio.
Não sei se o medo absoluto faz com que a vítima não reaja, mesmo imaginado que o que seria pior : morrer, machucar ou sofrer abusos físicos, psicológicos ou emocionais ?
Ontem o austríaco Josef Fritzl, 73 anos foi obrigado a se entregar na policia, após libertar a filha Elisabeth Fritzl, hoje com 42 anos, e que é mãe de supostos 7 filhos (um faleceu de complicações no parto) dele. Ele a violentava desde quando ela tinha 11 anos de idade.
Josef Fritzl a manteve em cativeiro por 24 anos, dentro de um porão, na área de sua própria casa, sem a mulher percebesse (mãe de Elisabeth) percebesse. O que é inacreditável. Isso aconteceu na cidade de Amstetten, localizada a 130 km de Viena.
A polícia austríaca realizou exames de DNA que comprovarão se Fritzl é o verdadeiro pai das crianças ou se há mais pessoas envolvidas no caso, conforme suspeita o chefe de policial local, Franz Polzer.
Essas sao situções variadas da chamada Síndrome de Estocolmo (Stockholm Syndrome), estado psicológico particular desenvolvido por pessoas que são vítimas de seqüestro. A síndrome se desenvolve a partir de tentativas da vítima de se identificar com seu captor ou de conquistar a simpatia do seqüestrador.
Foi um assalto a banco, em 1973, que deu origem ao nome da síndrome. A síndrome recebe seu nome em referência ao famoso assalto de Norrmalmstorg do Kreditbanken em Norrmalmstorg, Estocolmo, que durou de 23 de agosto a 28 de agosto de 1973. Neste acontecimento, as vítimas continuavam a defender seus captores mesmo depois dos 6 dias de prisão física terem terminado e mostraram um comportamento reticente nos processos judiciais que se seguiram. O termo foi cunhado pelo criminólogo e psicólogo Nils Bejerot, que ajudou a polícia durante o assalto, e se referiu à síndrome durante uma reportagem. O termo então passou a ser adotado por psicólogos e jornalistas do mundo inteiro.
A síndrome é relacionada a captura da noiva e tópicos semelhantes na antropologia cultural.
As vítimas começam por identificar-se emocionalmente com os sequestradores, a princípio como mecanismo de defesa, por medo de retaliação e/ou violência. Pequenos gestos gentis por parte dos captores são frequentemente amplificados porque, do ponto de vista do refém é muito difícil, senão impossível, ter uma visão clara da realidade nessas circunstâncias e conseguir mensurar o perigo real. As tentativas de libertação, são, por esse motivo, vistas como uma ameaça, porque o refém pode correr o risco de ser magoado. É importante notar que os sintomas são consequência de um stress físico e emocional extremo. O complexo e dúbio comportamento de afetividade e ódio simultâneo junto aos captores é considerado uma estratégia de sobrevivência por parte das vítimas.
É importante observar que o processo da síndrome ocorre sem que a vítima tenha consciência disso. A mente fabrica uma estratégia ilusória para proteger a psique da vítima. A identificação afetiva e emocional com o sequestrador acontece para proporcionar afastamento emocional da realidade perigosa e violenta à qual à pessoa está sendo submetida. Entretanto, a vítima não se torna totalmente alheia à sua própria situação, parte de sua mente conserva-se alerta ao perigo e é isso que faz com que a maioria das vítimas tente escapar do sequestrador em algum momento, mesmo em casos de cativeiro prolongado.
Não são todas as vítimas que desenvolvem traumas após o término da situação.
O caso mais famoso e mais característico do quadro da doença é o de Patty Hearst, que desenvolveu a doença em 1974, após ser seqüestrada durante um assalto a banco realizado pela organização militar politicamente engajada (o Exército de Libertação Simbionesa). Depois de libertada do cativeiro, Patty juntou-se aos seus captores, indo viver com eles e sendo cúmplice em assalto a bancos.
A síndrome pode se desenvolver em vítimas de sequestro, em cenários de guerra, sobreviventes de campos de concentração, pessoas que são submetidas a prisão domiciliar por familiares e também em vítimas de abusos pessoais, como mulheres e crianças submetidas a violência doméstica e familiar.
Há o recente caso de Wolfgang Priklopil, austríaco que raptou Natasha Kampusch quando esta tinha 10 anos e a manteve em cativeiro por 8 anos, a sujeitando a tortura psicológica e abuso sexual. Natasha defendeu o seu raptor, chegando inicialmente a rejeitar a família.
As bandas Yo La Tengo, Muse, Milburn e Blink-182, fizeram músicas inspiradas nessa síndrome.
No Brasil, um caso que chamou atençao foi o do sequestro da filha de Sílvio Santos (dono do SBT), Patrícia Abravanel, que, ao dar entrevistas, lembrava com afeto dos seus captores.
A síndrome de Estocolmo pode muito bem ser identificada na literatura infantil, no clássico conto dos Irmãos Grimm, “A bela e a Fera” que conta a história de uma garota bonita e inteligente que é vítima de cárcere privado por uma Fera, e por fim desenvolve um relacionamento afetivo e se casa com a Fera.
Fernand Koda